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quinta-feira, 25 de junho de 2015

Chego aos quase 37 anos a entender finalmente que não soube escolher a minha profissão. Pelo menos não soube escolhê-la pelos melhores motivos.
Quando tinha cinco anos decidi que queria ensinar. Fui seguindo o meu percurso sem pensar muito nisso: a decisão estava tomada e, mesmo que não muito conscientemente, nunca a pus em causa. Ingenuamente, assumi-a como certa.
Tudo me pareceu muito natural ao longo do caminho, como se eu encaixasse perfeitamente no currículo, ou vice-versa, e tudo quanto aprendi me pareceu exato e satisfatório.
Hoje percebo que nada é exato. Muito menos satisfatório. Preparei-me para ensinar, para encaminhar, para orientar, para ajudar. Aqui entra a exatidão, ou falta dela: não ajudo. No fundo, também não oriento. Pensando bem, não encaminho nem ensino. Como naquele ano em que dei a conhecer a gramática e, com isso, ganhei amizades para toda a vida. Ou naquele em que não aceitei que faltassem às aulas para ficarem a dormir e recebi em troca uma rosa no para-brisas a cada amanhecer. Ainda naquele em que não permiti que os estudos ficassem por ali e, sabem que mais, recebo daí ainda hoje as mensagens mais doces. 
Já passaram tantos anos e ainda sinto as mãos carinhosas na minha barrigona grávida ao toque de entrada e ao de saída. Ainda ouço os silêncios cúmplices à minha saída ano após ano. Ainda sinto na língua o sal das lágrimas de despedida. Ainda vejo aquele menino de joelhos, no portão da escola, a pedir-me para não ir enquanto me via sair despedaçado. Sinto os abraços todos. Não me esqueço de nenhum. 
Afinal, são os miúdos (sim, vocês, os que já vão de carro para a escola também são miúdos! E sim, os que já não conseguem renovar a carta também!) que me ensinam, que me encaminham, que me orientam e que me ajudam. Ensinam-me a sorrir com as suas conquistas, encaminham-me no orgulho que sinto por vê-los crescer e conquistar o mundo, (é um orgulho que nunca pensei sentir por quem não gerei. Pelos menos não biologicamente), orientam-me quando acho que não é nisto que devia trabalhar e ajudam-me a voltar a ter cinco anos e querer ser professora.

Obrigada, miúdos!