mais memórias para:
verdepinheiroemsepia@gmail.com

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Shhh...! Shhh...! It's, Oh, So Quiet... Shhh...! Shhh...!


O último post deixou-me a pensar. Eu, que sou uma gaja apaixonada pela complexa relação poligâmica entre fonemas e grafemas, tenho afinal a minha história alicerçada em silêncios.
Lembro-me, com mais consistência do que seria de esperar, do silêncio da rua dos meus pais à hora do almoço, sob o calor incandescente de Agosto. Lembro-me de reparar que o som dos talheres contra os pratos furava as janelas e batia colericamente contra a mudez daquela hora.
Lembro-me do silêncio das tardes, durante as sestas fastidiosas na Mata, apenas quebrado pela buzina da carrinha da peixeira. Ainda sinto a cabeça coberta (a fingir a noite) pelo cobertor áspero e castanho. E ainda consigo ver o tigre rabugento a tentar saltar do cobertor para o quarto do meio, onde me infligiam aquelas horas de sono gratificante.
Lembro-me do silêncio do anfiteatro da faculdade, durante as frequências, e de só ouvir canetas a fustigar o papel e o meu coração a sangrar. Duas vezes.
Lembro-me do silêncio do início das relações, primaveril, do que se impunha no seu fim e ainda do que ficava depois dele.
Lembro-me do silêncio que invadia a barraca, na praia do carvalhido, às 21 horas, quando as gaivotas iam para casa. E eu também.
Lembro-me de tantos silêncios que acho que é por isso que gosto de viver no meio da confusão. Para não me esquecer de que não consigo viver sem eles.

sábado, 29 de janeiro de 2011

flocos de vida

Os momentos inspiradores, aqueles em que me sinto tão vazia de mundo e tão cheia do que é só meu, são cada vez mais raros. Talvez por haver agora outras inspirações e por aspirar a ser uma pessoa o mais igual a todas as outras quanto possível, acabo por me quedar na mesmice aconchegante do dia-a-dia. Mas hoje voltei a ter um desses momentos. Passei pelas brasas por breves instantes, o que me levou àquele ponto intermédio entre a consciência e a consciência de mim mesma. Os tentáculos do sol invadiam a sala como que a colher os despojos opimos antes de partir para novas batalhas. Um bizarro silêncio aplacou a lufa-lufa do costume. E lembrei-me outra vez que a minha inspiração vem do ausente. E do provisório.